Empresas adaptam as fórmulas de
seus produtos para conquistar
o emergente mercado nordestino
Angélica Tasso
Nos últimos dois anos, o Nordeste deu um salto espetacular. Com seca
e tudo, a produção de riquezas na região aumentou dez vezes mais que
a média nacional. Com esses indicadores reluzindo nos relatórios
empresariais, aconteceu o inevitável: o Nordeste ganhou a atenção dos
fabricantes de produtos de consumo. "É o maior mercado emergente
do país", afirma Marcelo Heidrich Filho, diretor da Ponto de Criação,
uma das maiores empresas de marketing promocional, que acaba de
inaugurar uma filial no Recife. O novo alvo, no entanto, revelou-se
cheio de particularidades. As empresas logo descobriram que para
conquistar o consumidor nordestino não bastava levar até lá produtos
que faziam sucesso em outras regiões. Foi preciso adaptá-los ao gosto
e aos costumes locais.
Há exemplos curiosos. Na versão encontrada em lojas e supermercados
do Nordeste, as margarinas Delícia, fabricada pela Santista Alimentos,
Delicata e Claybom, da Unilever, recebem mais sal e mais corante
amarelo. A mudança serve para torná-las parecidas com a manteiga de
garrafa, tradicional na região. Só assim caíram nas graças das donas
de casa nordestinas. Essas consumidoras também preferiram a embalagem
plástica do sabão Ala. De acordo com as pesquisas anteriores ao lançamento,
o plástico se adapta melhor ao uso no tanque de lavar roupas. Até
mesmo a tradicional Pizza Hut, uma das maiores cadeias americanas de
fast food, teve de alterar sua receita padrão internacional. Em
Pernambuco e na Bahia, o cardápio passou a ostentar uma novidade: a
pizza baiana. A receita, criada especialmente para os dois Estados, tem
mussarela e catupiry e é carregada de peperoni, uma espécie de tempero
picante, cujo sabor é associado às apimentadas iguarias nordestinas.
Depois de fazer sucesso entre baianos e pernambucanos, passou a ser
vendida também nas lojas da franquia localizadas no Sul e Sudeste.
Cabelos cacheados – Há outras
peculiaridades no gosto nordestino. Em diversas pesquisas, as moças da
região torceram o nariz para alguns produtos de higiene pessoal
provenientes do Sul. A empresa Elida Gibbs decidiu, baseada nessas análises,
lançar seus desodorantes Impulse Vive e Flyaway, feitos de lavanda, com
fragrâncias mais suaves. A Gessy Lever agradou usando outro artifício.
Para colocar seu creme dental Cristal entre os mais vendidos na região,
aproveitou-se da sabedoria popular e acrescentou juá à sua fórmula
original. O juá, extraído do juazeiro, é rico em saponina, uma substância
que resulta em quantidade maior de espuma, e é muito usado pela população
local na escovação dos dentes. "Confirmamos que a erva possui
mesmo bom poder de limpeza", afirma Mônica Berto, gerente de
desenvolvimento de produtos da empresa. Como a Pizza Hut baiana, o creme
dental com juá passou a ser comercializado no resto do país, depois de
testado e aprovado nos Estados do Nordeste.
A polpa da planta babosa, ou Aloe vera, também já era usada
havia muito pelas nordestinas para hidratar os cabelos quando a Elida
Gibbs colocou no mercado xampus e condicionadores Seda Hidraloe, com a
substância. A meta era atingir o público de cabelos cacheados –
70% das mulheres nordestinas. À fórmula foi acrescido um silicone
especial que ameniza os efeitos nocivos do calor e do sol. Em menos de
um ano, o produto transformou-se em líder do segmento na região. Mais
uma prova de que os nordestinos sabem muito bem o que querem. Os
sorvetes da Kibon mais vendidos por lá são justamente os fabricados
com frutas típicas e produzidos exclusivamente na região: cajá,
mangaba, graviola e acerola.
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