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Moda de salto alto provoca acidentes e mortes no Japão 

Calvin Sims - New Yor Times

 Tóquio - Algumas semanas atrás, Tomomi Okawa, uma secretária de 25 anos, estava voltando do shopping dirigindo seu carro e bateu num poste de concreto. A amiga que estava ao lado morreu e Okawa teve sérios ferimentos na cabeça. Ela disse à polícia que não conseguiu frear porque estava usando botas de salto 6 (14,7 cm), a última moda entre as jovens japonesas.

Há três meses, a morte de Misayo Shimizu, funcionária de uma creche, foi atribuída a sapatos de sola grossa. Segundo a polícia ela tropeçou quando caminhava usando sandálias com solas de cortiça de 10 centímetros e fraturou o crânio. 

Para muitos japoneses essas mortes foram um alarme sobre o perigo dos calçados com solas altas, que há alguns anos tinham até 10 centímetros, mas hoje chegam a 20. Existe uma grande variedade de estilos de sapatos altos, desde sandálias rosa-choque para o verão a botas pretas para o inverno, com preços que vão de US$ 70 a US$ 200 (R$ 140 a R$ 400). As vendas anuais de sapatos com plataforma no Japão são avaliadas em US$ 100 milhões.

"Eu já caí e torci o tornozelo várias vezes, mas eles são tão bonitos que não vou desistir enquanto a moda não passar", disse Miwako Kimura, 15, usando botas de lona bege com solas maciças de 15 cm. "Eu gosto porque me deixam mais alta e minhas pernas ficam longas e torneadas", disse Aiko Kiuchi, cujas botas de 15 cm lhe conferem 1,65 metro de altura. "Você não imagina como é ótimo enxergar o mundo daqui de cima."

Os médicos da clínica ortopédica Tsukiji Seikotsuin disseram em entrevista recente que o número de mulheres que procuram a clínica com ferimentos causados por sapatos altos aumentou 20% no último ano.

Perguntada se não tem medo de cair novamente, uma paciente que torceu o pé no ano passado mas continua usando plataformas disse: "Eu tenho só 1,50 metro, mas com sapatos altos fico mais interessante". E acrescentou: "No metrô meus olhos ficam num nível superior ao dos homens de meia-idade, que são muito arrogantes no escritório". 

O governo está preocupado com o aumento dos ferimentos causados por esses sapatos. O Centro de Informações ao Consumidor do Japão, que é financiado pelo governo, divulgou um comunicado advertindo o público sobre os perigos relacionados e dando dicas para evitar acidentes. "A possibilidade de cair é grande devido à instabilidade", explica no relatório Yoshiro Musha, chefe de ortopedia no hospital Omori, da Cruz Vermelha. "Esses calçados não servem para caminhar por muito tempo nem para correr."

Entre a multidão em Shibuya, bairro de Tóquio famoso pela vida noturna, centenas de garotas pairam acima da massa com o auxílio de plataformas, que muitas vezes pesam mais de um quilo e dificultam o caminhar. Muitas parecem prestes a tropeçar, andando muito devagar com passos curtos e cautelosos. Algumas se seguram a um amigo ou a qualquer pedestre para não perder o equilíbrio.

Muitos japoneses se espantam com a quantidade de mulheres grávidas que usam saltos altos. Depois de ver uma jovem mãe claudicante com sandálias de plataforma, carregando o bebê nas escadas do metrô, a operária Yoko Togashi ficou tão revoltada que escreveu uma carta para o editor do jornal "Yomiuri Shimbun". "Ela é livre para usar o sapato que quiser e se machucar caso caia, mas como pode pôr seu bebê em perigo?", disse Togashi. "Será inútil lamentar depois de perder o filho. Ela deveria usar mais o cérebro."

Teruko Ishii, professora da escola superior Aoba Gakuen e que pesquisa questões de saúde relacionadas à vestimenta, fez uma pesquisa entre estudantes e descobriu que 23% já haviam caído usando sapatos de sola grossa. Quase a metade das que caíram sofreram fraturas ou ferimentos graves.

Ishii disse que as jovens japonesas que usam plataformas parecem as "oiran", uma espécie de prostitutas de alta classe que existiram no período Edo (1603-1868). As oiran eram conhecidas por desfilar em público usando quimonos espetaculares e tamancos altos chamados "takageta". Criadas as acompanhavam para ajudá-las a manter o equilíbrio. "As jovens de hoje andam como as oiran, mas isso não as parece incomodar", disse Hanada. "Elas são tão fascinadas pela moda que não conseguem avaliar se esses calçados são práticos ou não." 

Temendo ser processados, os fabricantes, que se concentram na região de Kobe, começaram a colocar etiquetas de advertência nos sapatos. Uma delas diz: "Como os saltos dos calçados são altos, por favor tome cuidado quando correr e subir ou descer escadas. Seja especialmente cuidadosa quando beber, porque poderá ficar oscilante. Nós, os fabricantes, ficaremos felizes se você se lembrar disso enquanto desfruta a última moda". 

Kana Matsumoto, 15, dona de quatro pares desses sapatos que parecem tijolos, disse que sua mãe desaprovou as sandálias de 20 centímetros de altura e as confiscou. "Mas ela devolveu depois que a peguei usando as sandálias em casa. Minha mãe é muito curiosa", disse a garota.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

 
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